domingo, 11 de outubro de 2015

Pesquisa mostra dados alarmantes de corrupção entre alunos nas escolas

Essa semana (de 05 de outubro de 2015) apresentaram uma matéria no Canal Globo News, com a seguinte manchete: “Pesquisa mostra dados alarmantes de corrupção entre alunos nas escolas”.

E seguem explicando que uma universidade do Rio de Janeiro entrevistou 1.100 alunos do Ensino Médio e Superior, com idades que variam de 16 a 30 anos e obteve os tais dados alarmantes.

A primeira questão que se apresenta é se esses dados são mesmo alarmantes. Quem está alarmado com eles? Como chamar de alarmantes algo que é corriqueiro em todas as instituições escolares - desde tempos imemoriais?

Então, a minha primeira implicância é chamar de alarmante, algo que definitivamente não é. Todos estão bastante acostumados com a rotina pesquisada. É uma inadequação linguística, em que se tira toda a força da palavra e do que significa ser realmente alarmante.

Creio que os jornalistas responsáveis simplesmente estão tirando proveito de que “está na moda falar em corrupção” e resolveram criar uma “cultura da corrupção” que começa nos bancos escolares.

(É a mesma lógica que tenta determinar que as pessoas que fazem xixi nas ruas, o fazem porque é natural do brasileiro, é uma atitude cultural... como ocorreu nessa mesma semana, na Revista O Globo).

Enfim, vamos aos dados da pesquisa.

58% dos alunos já pediram para colocar nome em trabalho de grupo sem ter participado da produção do mesmo.

Pergunta-se: o que você faria se o professor passasse um trabalho de grupo para a sua turma e você soubesse, de antemão, que ele sequer seria corrigido e só serviria para melhorar a sua nota, caso o seu nome estivesse lá?

68% dos alunos já copiaram textos da internet para apresentar em trabalhos.

Pergunta-se: o que você faria se o professor passasse um trabalho de grupo para a sua turma e você soubesse, de antemão, que ele sequer seria corrigido e só serviria para melhorar a sua nota, caso o seu nome estivesse lá?


59% dos alunos já assinaram a lista de presença em nome do colega.

Pergunta-se: o que você faria se, para o sistema escolar, o que importa é a marcação da sua presença, porque se você estiver lá, presentemente, fazendo perguntas e participando estará “atrapalhando” a aula?

69% dos alunos já colaram em provas.

Pergunta-se: o que você faria se, para o sistema escolar, o que importa e é valorizado é a nota para você passar de ano?

Certo, certo, que fique claro que não considero a atitude dos estudantes louvável. Mas merece uma análise contextualizada. As coisas não acontecem por acaso, nem surgem do nada, porque esse é bonzinho e aquele é mauzinho...

Não! As coisas se revelam e se perpetuam a partir de uma história que fica sempre, no caso das instituições escolares, hipocritamente escondidas.

Simplesmente, não se concebe mais a escola do jeito que ainda continua sendo! E não é a tecnologia que vai salvá-la num discurso de pseudo modernidade.

Alunos deixarão de ser “alarmantemente corruptos” quando a escola deixar de ser um local em que se idiotizam pessoas.

A escola – e, evidentemente, os professores – tem que estar um passo à frente dos alunos. Isso significa:

1. Trabalhos em grupo devem ser envolventes, de preferência feitos na própria escola – inclusive na universidade - , desafiadores e cada pessoa participante deverá expressar de alguma maneira a sua participação; atenção: a partir de uma proposta, os alunos de um mesmo grupo podem e devem discordar e apresentar também essa discordância.
Além disso, os professores costumam ter, no mínimo, 8 turmas por período letivo. Cada turma com uma média de 30 alunos. Ou seja, os trabalhos e provas de 240 alunos – semanalmente – vão se acumulando, porque não há quem consiga viver para corrigir trabalhos e provas, além de planejar, participar de reuniões etc.

2. Copiar texto da internet acontece da mesma maneira que íamos à Biblioteca Nacional copiar trechos inteiros de enciclopédias... Primeiro ponto: os professores aceitam os trabalhos copiados porque querem. É muito fácil perceber quando o texto não é do aluno. Segundo ponto: se, mais uma vez, o trabalho proposto for para o aluno pensar sobre e algo e dar a sua opinião, ou uma solução para uma determinada situação, por exemplo, não vai dar pra copiar... Mas se a proposta for: pesquise sobre o período colonial brasileiro... a resposta vai ser copiada. Com louvor!


3. Se abolirmos a lista de presença, tornando a participação dos alunos mais efetiva e realmente valiosa, não haverá necessidade desse tipo de controle industrial. Vamos lembrar que estamos falando de Ensino Médio (acima de 15 anos) e Ensino Superior (acima de 17). Como as instituições pretendem formar pessoas conscientes, autônomas e responsáveis se continuam tutelando as suas ações? Por que os alunos não podem agir com franqueza e respeito, dizendo que não vieram à aula porque dormiram demais em determinado dia? Por que não se estimula a autorregulação das pessoas que estão se tornando adultas? Por que os alunos que tentam dizer que a aula está chata e sugerem que os professores mudem a sua metodologia são considerados inconvenientes?

4. Se abolirmos as provas e testes como únicas maneiras de se avaliar os alunos, essa atitude será suficiente para que parem de colar. Não fará sentido ir para escola apenas para receber nota e passar de ano. A escola, hipócritamente, diz que os alunos não querem nada, mas nada é oferecido além do que se fazia no início do século XX. Alunos sentados, comportados e professor lá na frente falando, falando, falando... ou passando algum power point horroroso... Ao, final, verifica-se quem tem melhor memória. Com todo os estudos a respeito dos atos de aprender e ensinar, já sabemos, há muito tempo, que provas não avaliam coisa alguma. Não avaliam se houve ou não aprendizagem. Vamos lembrar de nós mesmos, realizando provas, e saindo decepcionados, porque na hora “deu um branco” e nos esquecemos de tudo... Avaliações são processuais, de diferentes em tipos (sim, pode e deve haver prova, sim, mas não apenas), em diferentes situações: individuais, em grupos, escritas, desenhadas, orais etc.


E aí sempre aparece alguém para dizer: mas como é que ficam o ENEM, os vestibulares, os concursos??? Vamos lá: instigar os alunos a pensarem criticamente, criar soluções, produzir para a sociedade é tarefa das instituições escolares e universidades, porque são locais de formação de pessoas na vida e para a vida. Quer fazer concurso? Quer se preparar para uma prova? Certo, esse é o departamento de cursinhos preparatórios, estudo em grupo e outros etecéteras. Ou seja: vamos falar de uma educação, de uma escola que transforma, e não um local de instrução que apenas reproduz o que já existe. O que já existe, conhecemos e não é bom.


Enfim, continuo não enxergando nada de alarmante nas atitudes dos alunos. Eles agem exatamente respondendo ao que se espera deles. São portanto, saudáveis e muito mais inteligentes do que possamos imaginar. Para uma instituição medíocre, vamos agir mediocremente.



http://globotv.globo.com/globonews/estudio-i/v/pesquisa-mostra-dados-alarmantes-de-corrupcao-entre-alunos-nas-escolas/4527209/

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