quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

Sobre Educação e laptops

Em resposta a ESCOLAS DA FINLÂNDIA NÃO REVELAM PAIXÃO PELO COMPUTADOR, publicada em terça-feira, 1 de dezembro de 2009 - http://questoesdeaprendizagem.blogspot.com/2009/12/escolas-da-finlandia-nao-revelam-paixao.html

Sr. Ethevaldo, vamos por partes, que são muitas...

Logo na sua primeira frase: A Finlândia oferece à sua população aquela que é considerada a melhor educação entre todos os países do mundo. É a melhor, sem dúvida, para os finlandeses, porque deve dar os melhores resultados para o projeto de sociedade que esse país valoriza. A sequência de motivos que supostamente garante o sucesso dos resultados, reitera que o que é melhor para cada um, é o que é mais adequado para cada um. O que não quer dizer que o modelo deles sirva - ou seja melhor - para qualquer outro país.

Em relação ao depoimento do professor, no segundo parágrafo, eu, particularmente, preferia ouvir de um professor que ele se sente responsável pela formação emocional e intelectual dos seus alunos para o mundo de hoje - o futuro é imprevisível - que ele se mostre comprometido com a formação de pessoas melhores, para além do próprio conhecimento. O mundo está cheio de gente sabida e sem caráter. Precisamos de pessoas que tenham consciência e ajam em prol de um meio ambiente decente e da não violência. Precisamos de humanidade.

Em nenhum momento da minha vida profissional docente me senti desrespeitada pela minha escolha. Meu salário não é maravilhoso, mas é condizente com o que ganha a maioria da população do meu país. Não tenho nenhum desejo de participar de classe de grandeza alguma. Sou da classe dos seres humanos.

O Sr. Ethevaldo tem muita certeza da "dose certa, no momento exato e de modo correto", como se fossem coisas quantificáveis e verdades iguais para todos. Em seguida, exemplifica o "uso correto" dos computadores como sendo um curso ministrado - Sr. Ethevaldo, ninguém ministra mais aulas há algum tempo. Ministram-se palestras, ministram-se remédios. Ministrar significa `passar algo`, `transmitir', 'dar`; significa uma atitude ativa (de quem transmite) e uma atitude passiva (de quem recebe). Aulas, em escolas, pressupõem interatividade, análises, desconstruções, reconstruções, recriações e criação de novos conhecimentos -. O que nos leva ao próximo passo: um curso que prepara para o `uso competente` dos computadores e da internet? O que é o uso competente de computadores e da internet? Conhecer e utilizar o pacote office? Saber pesquisar no google? Lidar com as coisas 'sérias' da web? Isso é pouco, é muito pouco, queremos e precisamos de muito mais.

Mais uma vez, Sr. Ethevaldo, o que é considerado 'uso competente' dos computadores para o sistema educacional finlandês, pode ser considerado pouco competente para nós.

E, chegamos ao UCA - no Brasil, é "Um Computador por Aluno" -, baseado nas ideias da OLPC.

Somos, sim, Sr. Ethevaldo: bem intencionados, idealistas e apaixonados pela Educação, pelas crianças e jovens de nosso país emergente (esse termo ainda é utilizado para nos caracterizar?)

Meu Deus, Sr. Ethevaldo, por favor, saia um pouco do senso comum e tente racionar com outras partes do seu cérebro. Estou certa que o sr. é capaz. Quer dizer que, na sua concepção, alunos do RJ e de SP não poderão transitar com os seus laptops? Está certo... a violência urbana é muito ruim no RJ e em SP; já nas outras capitais... Procure se aproximar mais do Projeto e conhecer um pouco mais a fundo as alternativas já pensadas e postas em prática sobre essa questão. Em Porto Alegre (que, segundo o seu ponto de vista, deve ser uma cidade muito segura) os alunos já levam e trazem os laptops para casa há 2 anos, sem incidentes.

Voltamos ao mote. O que é bom para os finlandeses não é necessariamente o melhor para nós. O que o faz pensar que a utilização rotineira dos laptops é sem critérios? O que o leva a acreditar que professores brasileiros não pensam, não planejam, não avaliam, não têm objetivos de ensino? Quem informou ao sr. que não existem projetos pedagógicos bem definidos (e adequados a cada escola) dentro do UCA? O sr. já deve ter ouvido falar nas Universidades Federais. Pois são elas que dão suporte regional aos projetos das escolas, de maneira coordenada pelo MEC. Os maiores expoentes em Tecnologia Educacional e áreas afins, do nosso país, estão envolvidos no UCA.

Quanto ao aproveitamento dos alunos, as nossas pesquisas demonstram justo o contrário: os alunos ficam mais atentos e produtivos diante dos laptops. Ou o sr. acredita que um aluno de 15 anos, ficar ouvindo um professor de Biologia discorrer sobre a duplicação do DNA e a síntese das proteínas, quieto - sem perturbar o professor - está concentrado na aula? O sr. lembra da sua infância e juventude? Pensava em brincadeiras, nos amigos, e em sexo enquanto seus professores falavam lá na frente? Pois é, Sr. Ethevaldo, mudou muito não. Nossas crianças e jovens continuam pensando nas mesmas coisas, incluindo diferentes maneiras de provocar os professores...

Antes que eu esqueça, Sr. Ethevaldo, computador não é ferramenta didática. Computador não é projetor de slides, álbum seriado ou retroprojetor. Computador é maneira diferente de pensar, que envolve novas organizações, relacionamento entre pessoas e elementos, arquivamento de dados, pesquisa e criação. Computadores ligados na web são formadores de novas concepções sociais, ambientais, artísticas e econômicas.

Meu Deus, Sr. Ethevaldo, o sr. vive em que planeta? E está com medo de quê? Parte de um princípio de que os alunos já devem vir de casa sabendo alguns aplicativos... é como dizer que os alunos pequenos já deveriam vir para a escola alfabetizados... Isso seria ótimo, não? Pouparia muito trabalho aos professores alfabetizadores... além de achar, realmente, que estamos na Finlândia, porque acredita que os alunos tenham computadores em suas casas. E termina esse parágrafo, falando da utilização dos computadores para 'ilustrar' as aulas, com se fossem gravuras (haja reducionismo, né?), e sob `estrita orientação do professor`... vai que um aluno `esperto`queira entrar num orkut ou msn, hein? Que pesadelo! Sr. Ethevaldo, não se educa com proibição. Educa-se com consciência. Pais e professores têm que orientar a utilização da internet, da mesma maneira que a minha mãe me dizia para não aceitar balas de estranhos na rua... mas nem por isso me impedia de andar nas ruas.

Realmente, concordamos aqui, Sr. Ethevaldo, nenhuma tecnologia por si só vai revolucionar a qualidade da educação no nosso país. Mas, fiquei curiosa, onde é que o sr. ouviu falar que os professores esperam essa mágica?

E aí, lá vamos nós outra vez. De todos os fatores que o sr. cita como sendo fundamentais para que exista uma real melhoria na qualidade do ensino no nosso país, concordo com quase todos, acrescentaria outros. Mas vou me deter apenas no último: "envolvimento direto da família e da sociedade no problema da educação". De qual família estamos falando, Sr. Ethevaldo? Daquela idealizada nos livros didáticos da década de 50, constituída de pai, mãe, filho, filha, avó, avô (todos brancos) e uma empregada (negra) agregada?

Sr. Ethevaldo, as famílias, atualmente, têm as mais diferentes formações, poucas são as que mantém uma formação tradicional. No caso das crianças muito ricas, quem cuida delas são a babá e o motorista - os pais costumam estar sempre viajando; no caso dos que têm condição financeira mediana, quem cuida é a avó - os pais, normalmente divorciados, estão trabalhando - e, no caso dos alunos de pouca condição financeira: ninguém ou o irmão mais velho de 8/10 anos (a mãe trabalha e o pai sumiu). Essas realidades não são boas nem ruins. Apenas são. Pra qual destas famílias o sr. acha que devemos atribuir a responsabilidade de um maior envolvimento com a escola? A educação, de uma maneira bem abrangente, é de responsabilidade da escola. Sabe por quê? Porque não estamos na Finlândia!

Quase concluindo... não temos escolas de 1o e 2o graus desde 1996... Desde então, chamamos de Ensino Fundamental e Ensino Médio. O `projeto eleitoreiro`, como o sr. denominou, começou em 2006. O sr. já profetizou que os resultados do projeto serão nulos. Volto a pedir que o sr. procure conhecer um pouco mais sobre o assunto, porque já temos resultados muito bons. Se precisar, posso ajudá-lo com a pesquisa que deveria ter sido feita, antes do sr. escrever o seu texto.

Vou aproveitar e pedir outra coisa ao sr.: leia um pouco de Sérgio Buarque, Gilberto Freyre, Darcy Ribeiro e Milton Santos. Quem sabe o sr. passe a compreender melhor quem somos nós, brasileiros, e com alguma sorte, quem sabe o sr. venha até a gostar de ser um deles. De quebra, escute Chiquinha Gonzaga, Villa Lobos e Tom Jobim.

Denise Vilardo
Profa. da Rede Pública Municipal do Rio de Janeiro
Coordenadora Pedagógica do Colégio Graham Bell/RJ

segunda-feira, 16 de novembro de 2009

Entrevista à Folha Dirigida

FOLHA DIRIGIDA / CADERNO DE EDUCAÇÃO – 6 A 12 DE DEZEMBRO DE 2001

Denise Vilardo diz que a leitura e a escrita são quase como respirar e falar.


Mais do que um hábito, a professora Denise Vilardo, da diretoria de Educação Fundamental da Secretaria Municipal de Educação do Rio de Janeiro, diz que a leitura deveria ser um vício. Segundo ela, o acesso ao livro é essencial para o que o estudante dos dias atuais possa exercer sua cidadania.

"É fundamental, é básico! A leitura e a escrita são quase como respirar e falar, ou seja, nos dias de hoje é extremamente difícil alguém sobreviver na nossa sociedade sem o desenvolvimento dessas habilidades. Aliás, a leitura deveria se tornar um vício. Apenas hábito é pouco, além de ter uma conotação de coisa chata. Já vício é aquilo que traz prazer e você não consegue se livrar. Se tiver que haver um vício do bem, que seja o da leitura", observa.

Denise Vilardo ressaltou ainda a motivação dos estudantes da rede municipal de ensino ao participarem do Projeto Redação 2001. Segundo ela, cada escola teve liberdade para escolher os temas e selecionar o texto que representaria a instituição. O objetivo, segundo Denise Vilardo foi permitir que o concurso de redação fizesse parte da orientação Pedagógica das escolas.

“A orientação que demos foi que o produto final (no caso, a redação) fizesse parte do processo pedagógico que o aluno estivesse vivenciando - para que o mesmo não “caia de pára-quedas" nem na cabeça do aluno, nem na do professor - ou seja, que o professor articulasse a proposta do projeto com os conteúdos que ele estivesse trabalhando", expli¬ca Denise Vilardo.


Eis a entrevista:


Folha Dirigida
- Como foi a realização do Projeto Redação 2001 nas escolas da rede municipal de ensino? Como a coordenação enfrentou o desafio de escolher, entre tantos da rede, os que comporiam os livros com as redações selecionadas no concurso de redação?


Denise Vilardo
- A realização do projeto se deu através da ampla divulgação de seu regulamento, cartazes e fichas de inscrição, além do envolvimento e apoio que tivemos dos Coordenadores das dez Coordenadorias Regionais de Educação (E- CREs). Quanto à escolha, ficou combinado, desde o início, que a seleção se daria na própria unidade escolar - que deveria nos enviar apenas um texto, que representaria a escola.

Folha Dirigida - Qual foi a orientação geral da Secretaria Municipal de Educação para as escolas realizarem o concurso de redação? As famílias foram, de alguma forma, envolvidas no Projeto?


Denise Vilardo
- A orientação que demos pode ser estendida a todos os projetos dos quais fazemos parte, que é, em primeiro lugar, que o produto final (no caso, a redação) faça parte do processo pedagógico que o aluno esteja vivenciando - para que o mesmo não "caia de páraquedas" nem na cabeça do aluno, nem na do professor - ou seja, que o professor articule a proposta do projeto com os conteúdos que ele estiver trabalhando; em segundo lugar, é fundamental que os envolvidos queiram participar do projeto, se sintam motivados para participar. No caso do Projeto Redação 2001, o fato do tema ser livre, facilitou ainda mais o engajamento do professores e dos alunos. Quanto ao envolvimento das famí1ias a importância delas fica evidente nos textos dos alunos.
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Folha Dirigida - Quantos estudantes participaram do Projeto Redação 2001 na rede municipal de ensino? Quantos estudantes a rede possui atualmente? Como foi a receptividade dos participantes ao concurso?


Denise Vilardo
- "Nós recebemos 121 redações, o que significa dizer que tivemos 121 escolas envolvidas. Quanto ao número de estudantes que participaram é difícil afirmar porque, como já foi dito, cada escola escolheu apenas uma redação para nos enviar. Não podemos precisar quantas turmas foram envolvidas neste processo. A rede municipal conta, atualmente com quase oitocentos mil alunos no Ensino Fundamental, incluindo aí a Educação Infantil e os alunos do Projeto Educação Juvenil. A receptividade e a expectativa que os projetos geram são sempre positivas. Aliás, a participação de nossos alunos e professores em diferentes projetos - inclusive de abrangência nacional – tem sido motivo de muito orgulho para a SME, pois estamos sempre sendo agraciados pela qualidade dos trabalhos apresentados.

Folha Dirigida - O que representou, para a Secretaria Municipal de Educação, participar deste concurso?


Denise Vilardo
- Todo projeto que venha a incentivar a participação de nossos alunos e, conseqüentemente, a sua inserção na sociedade letrada, mostrando a sua capacidade, criatividade e competência, será bem-vindo. O Projeto Redação 2001 traz de interessante a possibilidade de nossos alunos terem os seus textos divulgados através de um livro, o que vai fazer com que mais pessoas conheçam a qualidade do trabalho que é desenvolvido nas Escolas Municipais. E também uma oportunidade de divulgar atitudes positivas para a população, num momento em que só se divulgam atitudes negativas, principalmente o que diz respeito às classes menos favorecidas da sociedade. Esse Projeto mostra, fundamentalmente, que os alunos são capazes de pensar criticamente sobre o mundo que os rodeia.


Folha Dirigida
- Na sua opinião, qual a importância da leitura e da escrita dentro do processo de formação escolar?


Denise Vilardo
- É fundamental, é básico! A leitura e a escrita são quase como respirar e falar, ou seja, nos dias de hoje é extremamente difícil alguém sobreviver na nossa sociedade sem o desenvolvimento dessas habilidades.E quando falo em leitura e escrita, não apenas soletrar palavras (ler e não entender o que lê), ou escrever apenas o essencial. É algo mais. É o aluno se apropriar da leitura e da escrita como processos internos seus, que o auxiliam a pensar melhor, que têm características próprias, embora as funções sejam comuns. As exigências sociais apontam, cada vez mais, para a necessidade de se dominar essas habilidades com competência e, é claro, a escola é essencial nesse processo, atuando como formadora / desafiadora em sua proposta pedagógica.

Folha Dirigida - Que benefícios o hábito da leitura e o domínio da expressão escrita são capazes de trazer aos estudantes?


Denise Vilardo
– O principal benefício é se sentir um cidadão pertencente ao mundo, e não apenas espectador da vida. Aliás, a leitura deveria se tornar um vício. Apenas hábito é pouco, além de ter uma conotação de "coisa chata". Já o vício é aquilo que traz prazer e você não consegue se livrar. Se tiver que haver um "vício do bem", que seja o da leitura. Já a expressão escrita é uma das formas do homem dizer de si e do mundo, podendo registrar suas crenças, seus sentimentos, dúvidas e certezas, produzindo novas formas de dizer, podendo registrar e compartilhar suas idéias. Acho que isso tudo colabora para a formação de um indivíduo mais feliz, que é, em primeiríssima instância, o motivo pelo qual vamos para a escola.

Folha Dirigida - Educadores são unânimes em afirmar o papel fundamental do incentivo à leitura e à escrita. No entanto, não são poucos os que afirmam que o estudante brasileiro ainda lê pouco e escreve mal. A senhora concorda com estas idéias?


Denise Vilardo
- Essa resposta daria uma tese... Vamos por partes: o estudante brasileiro lê pouco e escreve mal. Eu diria que o professor brasileiro lê pouco e também escreve mal. Por quê? Porque vivemos num sistema econômico extremamente perverso, em que os livros custam,em média, R$30,00. Esse é um valor proibitivo para o professor brasileiro. Significa, segundo os esforços do nosso Ministro da Educação, dez por cento do salário nacional para os professores... esse para mim é o principal motivo para as pessoas não lerem livros (revistas e jornais também são caros para se estabelecer uma rotina de leitura). Quanto a escrever mal, eu diria que nós escrevemos pouco. Nós não temos uma cultura de escrever. Os cursos médios e superiores não exigem que se escreva. Quanto mais você avança na escolaridade, menos você escreve/inscreve a sua palavra. O sujeito é capaz de se formar num curso de graduação, sem ter escrito uma linha sequer de sua própria criação. Fomos formados, acreditando que só escreve bem quem tem um dom. Fomos forjados com essa "falsa verdade", e os cursos continuam fazendo isso com os estudantes. Fazendo as pessoas acreditarem que não são capazes... Esse é o resulta¬do. E aí saímos por aí, acreditando em um monte de "lugares-comuns", e buscando outro monte de culpados, espalhando que lemos pouco e escrevemos mal... Fala sério!... Quanto aos incentivos, a situação está melhorando. Hoje em dia existem vários movimentos governamentais e não governamentais que incentivam a leitura e a expressão escrita.

Folha-Dirigida - Como a senhora avalia a situação das bibliotecas públicas no Rio de Janeiro? A criação de mais espaços como estes poderia ser uma forma de estimular o estudante a ler mais?

Denise Vilardo
- Ainda são poucos os espaços existentes e a programação oferecida é muito mal divulgada. Falta a mídia se interessar... É claro que quanto mais espaços tivermos, mais incentivo teremos para ocupá-los. O que é necessário, é que esses espaços sejam de produção de leitura; ou seja, há que haver espaço para contação de histórias, para dramatizações, para troca de impressões sobre as leituras feitas e, também, para uma boa leitura silenciosa. O estudante vai se interessar mais pela leitura, na medida em que a escola estimulá-lo a ler pela boniteza da palavra escrita e não para fazer prova, ou para responder a perguntas em um teste.


Folha Dirigida
– Quais os principais programas de incentivo à leitura e à produção textual desenvolvidos atualmente pela Secretaria Municipal de Educação?

Denise Vilardo
- A SME desenvolve alguns projetos que têm, por mérito, o fato de terem surgido dentro das escolas, através de trabalhos desenvolvidos pelos professores e que foram acolhidos por esta Secretaria para serem compartilhados com os professores de todas as escolas. Há onze anos temos o Projeto Poesia na Escola, que tem como objetivos trabalhar questões teórico-metodológicas relativas ao fazer poético, "apresentar" diferentes poetas e suas poesias, estimular a produção do texto poético tanto em alunos, quanto em professores, através de oficinas para os professores. Esse trabalho se desdobra nas salas de aula, com os alunos e, anualmente, temos um "Concurso de Poesia", onde são selecionados cerca de 60 poemas de alunos e 60 poemas de professores, que formam duas coletâneas distintas e são publicadas em livros e distribuídas às escolas. Outro projeto que temos já há dezessete anos, é o "Lendo e escrevendo com prazer" que, em sua versão atual, trabalha com uma temática determinada a cada ano, mobilizando os professores, através de oficinas, onde são discutidas questões relativas aos diferentes tipos de texto e sua produção. Cabe lembrar que, só neste ano, a Prefeitura disponibilizou R$500,00 para cada escola comprar os livros que julgasse mais interessantes para seus alunos e professores, para serem gastos na Bienal e outros R$500,00, com a mesma finalidade, para o Salão do Livro Infanto-Juvenil, que ocorreu recentemente no MAM. Além de, é claro, participar de todos os projetos que estimulam a participação social dos alunos, como o Redação 2001.

DEBATES FIZERAM PARTE DA ROTINA DO PROJETO

Cada escola que participou do Projeto redação 2001 procurou orientar o concurso da forma em que se encaixasse mais perfeitamente com sua orientação pedagógica.

No entanto, pode-se dizer que um traço comum a todas foi o fato de todas realizarem atividades específicas voltadas para embasar os estudantes antes da elaboração dos textos. Na maior parte dos casos, esta preparação foi feita através de debates, em sala de aula, a respeito dos temas escolhidos pelas equipes que coordenavam o projeto. Estudantes e professores, neste caso, levaram reportagens, textos e outras fontes de informação para incrementar as discussões.

A etapa de preparação, que precedia a data em que os estudantes eram reunidos para a elaboração de seus textos, não ficava apenas nos debates. Em várias escolas, professores levavam vídeos, livros e promoviam palestras com especialistas dos variados temas. Além disso, os estudantes foram incentivados a procurar em páginas da Internet material informativo que, depois, poderia ser usado em seus textos.

Carta a O Globo

Rio de Janeiro, 02 de fevereiro de 1999

Sr. Editor, gostaria que o mesmo espaço dado ao Prof. Jerônimo Rodrigues de Moraes Neto, da UFRJ, para publicação do seu artigo A Educação caiu do cavalo, de 02/02/99, fosse concedido a mim, numa tentativa de esclarecimento ao público.

A EDUCAÇÃO NÃO CAIU DO CAVALO PORQUE ANDA DE CARRO

É fato que a crise econômica tem levado alunos oriundos das escolas particulares para as escolas públicas. É fato, também, que, assim que a situação familiar melhora um pouco, os pais retornam com os filhos para as escolas particulares.
Por que são melhores? Há controvérsias...
Gostaria de relativizar essa situação. É senso comum – e por isso mesmo está no imaginário social – que escola boa é a particular...
Podemos enumerar alguns motivos discutíveis:
a) é porque não há falta de professores;
b) é porque o “ensino é puxado”;
c) é porque “não quero que meu filho se misture”;
d) e, agora, é porque reprova.
Quanto ao primeiro possível motivo alegado, é fato que a Secretaria Municipal de Educação do Rio de Janeiro tem se esforçado para garantir a presença dos professores nas classes, utilizando desde a abertura de concursos, periodicamente, até a contratação esporádica de profs. por tempo limitado.
Note bem: a falta de profs. não deve ser vista como conseqüência de baixos salários, uma vez que a maioria das escolas particulares, no Rio de Janeiro, paga menos que a Prefeitura. Não podemos ter como parâmetro meia dúzia de escolas que realmente pagam acima da tabela do sindicato, certo?
Na verdade, administrar uma Rede de quase 40 mil professores que se aposentam e se licenciam por motivos de saúde, ou para estudos – sim, a Prefeitura concede licenças para estudo, porque quer um professor qualificado, atualizado – requer muita competência.
Quanto ao item b, a maioria das famílias cai na balela do “ensino puxado”, muito mais por tradição, ou porque “no meu tempo era assim...” – que, normalmente, se traduz em páginas e páginas de deveres de casa, muitas unidades dos livros didáticos para estudar, questionários para responder e pesquisas que só os pais conseguem realizar.
Podemos enumerar, aqui também, os equívocos: os incontáveis deveres de casa servem, acreditam, para fixar a matéria dada na escola, esquecendo-se que a aprendizagem é construção e não fixação para decorar, além de, é claro, manter a criança ocupada com os deveres, que assim não pensa e nem faz “besteira”, e nem dá trabalho aos pais...
A escola é boa porque é exigente. Exige dever, exige nota, exige disciplina rígida. Afinal, alguém tem que dar educação a essas crianças... É a escola do “não pode”.
Naturalmente, deve ser por este motivo, que a população brasileira é tão educada, sabida, e a elite de maior prestígio, que tem os rumos do país em suas mãos, é tão competente, tão honesta, é óbvio que é porque é fruto dessa escola exigente, que sempre foi tão boa...
O item c é o que, normalmente, as pessoas custam mais a assumir, mas que funciona mais ou menos assim: “Meu filho? Junto com aqueles favelados?”; “Aqueles meninos do CIEP não querem nada. Lá só tem preto. Eles não têm nem família!”
A quem estamos querendo enganar? É a Bélgica não querendo se encontrar com a Índia...
Somos brasileiros, misturados e deveríamos nos orgulhar disso, ensinando nossos filhos a respeitarem o próximo – que não é tão diferente assim de nós mesmos, como alguns querem crer.
O último item é o mais polêmico e as pessoas, afoitamente, começam a pré-julgar as situações, mais uma vez, dominadas pelo senso comum.
Escola boa é a que reprova. Por quê?
Desde quando ser reprovado em alguma coisa é bom?
Quantas pessoas foram reprovadas na sua trajetória escolar, porque ficaram faltando alguns décimos para alcançar a nota final? E tiveram que repetir um ano letivo inteiro, ouvindo as mesmas coisas que o ano anterior? Isso significa um ano na vida de uma pessoa. Será que é pouco? E o desestímulo que uma reprovação acarreta? E o sentimento de “sou burro”, “não consigo aprender”?
Em que isso ajudou/ajuda as pessoas a serem mais felizes ou mais sabidas?
É preciso que fique claro que, por trás de uma medida institucional – como a atribuição de conceitos PS – Plenamente Satisfatório (e, não, planejamento satisfatório como foi publicado); S – Satisfatório e EP – Em Processo – adotada pela SME/RJ, há estudos, há teorias, há muita prática, há discernimento, há consulta aos profs., há proposta filosófica e compromisso com cerca de 700 mil alunos e a população dessa Cidade que quer – e nós oferecemos – uma escola pública de qualidade.
É preciso que professores e não-professores entendam que o compromisso da Educação é com o ENSINAR e o APRENDER, e não com a aprovação ou a reprovação.
O prof. que , nos dias de hoje, se sente aviltado porque lhe tiraram o poder de aprovar ou reprovar, perdeu o bonde da história; colocou todas as suas fichas num cavalo manco – já que o prof. a quem tento responder gosta de metáforas envolvendo animais – e agora se sente injustiçado. Ah, coitado...
Será que é isso mesmo?
O professor é o único profissional que se orgulha da derrota. “Reprovei 30 alunos!” Que beleza!
E as famílias acreditam que esse professor é que é bom. É firme. É rígido. Com ele não tem brincadeira.
Eu não quero que o meu trabalho seja reduzido a um mero “aprovei ou reprovei tantos alunos”. Eu não preciso reprovar alunos para provar que a minha disciplina é importante e muito menos usar a avaliação (entenda-se testes e provas) para “dominar a turma” ou ameaçá-los.
Não é verdade que eu precise “submeter periodicamente” os meus alunos a uma avaliação, para me sentir mais honrada ou para justificar que o meu trabalho é sério e de qualidade.
Avaliação faz parte do processo pedagógico, da rotina escolar, e serve apenas para redirecionar o meu trabalho. Serve apenas para que eu verifique onde as coisas não vão bem para que possa melhorá-las.
Se existe a “cultura da nota” e não acreditamos mais nela, cabe a nós mesmos mudar o que esta aí.
Com todo o respeito, “... a alegria de encontrar a verdade...” vai depender de onde ela está e com quem. A partir de que pressupostos?
Prof. Jerônimo, todos têm direito à Educação. Todos têm direito à alegria. Não apenas os alunos dos grandes colégios particulares do Rio de Janeiro, como o Sr. teima em comparar.
Não há leviandade em querer que alunos da Rede Pública APRENDAM, sem precisarem ser massacrados pela escola. Com certeza a vida já se incumbiu de massacrá-los.
Não é reprovando que se garante seriedade. Se assim fosse, do jeito que reprovamos tanto todo esse tempo, seríamos um povo carioca seríssimo...
E a SME/RJ não quer a aprovação automática. Quer, sim, que os professores ensinem e que os alunos aprendam; que sejam vistos, professores e alunos, como sujeitos, cidadãos que estão fundando um novo tempo.
Tempo de compreensão, de sabedoria, de solidariedade, de respeito, de justiça, de realidade (e não de faz-de-conta).
Tempo, prof. Jerônimo, de andar de carro, e por isso não dá mais pra cair do cavalo.






Profª Denise Vilardo Nunes Guimarães
Profª. da Secretaria Municipal de Educação do Rio de Janeiro
Profª da Rede Particular

quarta-feira, 12 de agosto de 2009

Gripe suína + Rede Social + Educação = Inovação

O mote: a gripe suína

A necessidade/o desafio: retomar o ano letivo no Colégio Graham Bell, sem prejuízo das aulas para os alunos e sem que eles fiquem juntos

A condição: Rede Social Peabirus

O mote, decididamente, não é empolgante. Mas é absolutamente persuasivo  não fiquem juntos, em locais fechados, porque vocês podem pegar uma gripe e morrer.

A necessidade/responsabilidade com a aprendizagem dos alunos, o cumprimento legal de 200 dias letivos, a retomada das aulas. O desafio de dar continuidade ao curso com os alunos separados, em locais diferentes.

A condição, viabilizada pela Rede Social Peabirus, veio de encontro a uma vontade acalentada há algum tempo.

A Rede Peabirus é a primeira plataforma de Articulação Social, totalmente brasileira e, como tal, conecta profissionais, instituições e empresas. Além de procurar desenvolver oportunidades de negócios, se propõe a compartilhar informações e construir conhecimentos. É uma Rede que busca a inovação em tempo integral.

Desde 2006 que mantemos a Comunidade do Colégio Graham Bell (http://www.peabirus.com.br/redes/form/comunidade?id=577 ), com o objetivo de ser um ambiente de cooperação que facilita e promove a troca de informações não apenas sobre o próprio Colégio, mas também na geração de conhecimento coletivo acerca de questões relacionadas à Educação.

Estamos cada vez mais convictos que as Redes Sociais são um vasto ambiente de Aprendizagem, não apenas no sentido informal, mas também potencialmente formal. Tudo depende da maneira como as utilizamos.

Temos, no mesmo espaço, informação, compartilhamento de idéias, lazer e possibilidade de construção de novas concepções. De que mais precisamos para educar?

As Redes Sociais propiciam não só a possibilidade de interagirmos socialmente mas, na nossa concepção, são espaços de convergência que permitem o debate, através da "navegação" - que é a própria base das Redes.

No caso específico da Rede Peabirus, ela facilita o fluxo de informações (pessoais, institucionais e comerciais) de seus membros e, por isso, suas páginas são abertas para a navegação de usuários não logados e seus conteúdos são indexados e distribuídos em vários ambientes na Internet: mecanismos de busca, microblogs, social bookmarks, outras redes sociais, mapas, sites, blogs, portais entre outros. Permite, ainda, a publicação de conteúdos como textos, imagens, vídeos, áudios, hyperlinks, widgets, gadgets, mashups, a troca de mensagens e o desenvolvimento de ações de e-commerce de maneira totalmente livre para os usuários cadastrados e logados.

Uma condição de sobrevivência nesse meio é a constante atualização de recursos. Nesse sentido, a Rede Peabirus também não pára!

Além de oferecer os mecanismos já tradicionais de criação de comunidades sobre todos os temas (institucionais ou não) e a possibilidade de participação de "n" maneiras (fóruns, mensagens e outros etecéteras), também proporciona a distribuição dos conteúdos dentro e fora da Rede Peabirus.

Por todos esses motivos e por mais alguns, propusemos a essa Rede Social uma parceria para que nossos professores e alunos começassem a utilizá-la de maneira formalizada e intencionalmente educativa.

Criamos Comunidades para todas as disciplinas e é nesses espaços que alunos e professores estão imersos, aprendendo e ensinando uns aos outros.

O Colégio Graham Bell é uma Cooperativa de Educadores, fica no Rio de Janeiro, e o nosso foco é o Ensino Médio Técnico, nas áreas de Telecomunicações, Informática e Eletrônica.

Temos por meta oferecer e construir uma educação diferenciada, em que o aluno é realmente o centro das nossas atenções, como um indivíduo que pensa, tem sentimentos, desejos e está tentando compreender esse mundo em que vivemos. Trabalhamos com a autonomia, o conhecimento e a responsabilidade desse ser que já um cidadão.

Acreditamos que os jovens querem muita coisa, contrariando os que gostam de afirmar que “eles não querem nada” e nos sentimos responsáveis para ajudá-los a se tornarem pessoas mais sabidas e felizes.

Estamos no endereço: http://www.peabirus.com.br/redes/form/inicio

Denise Vilardo
Coordenadora Pedagógica do Colégio Graham Bell

sexta-feira, 29 de maio de 2009

Não se educa com proibição!

De acordo com a Lei 5453/09, recém sancionada pelo governador do Estado do Rio de Janeiro, está proibido o uso de aparelhos MP3, MP4, walkman, game boys, agendas eletrônicas, máquinas fotográficas, além dos celulares nas salas de aula, bibliotecas e outros espaços de estudo das escolas da Rede Estadual.

Convido a todos os interessados a fazerem uma reflexão comigo a partir da seguinte premissa: qualquer atitude de proibição, pura e drasticamente, deseduca mais do que educa.

Todas as vezes que lidamos com o que é proibido, temos mais vontade ainda de realizá-lo. Isso é natural do ser humano. Proibir por proibir, ou criar mecanismos de censura ao que julgamos que deva ser censurado, costuma acirrar mais ainda a vontade de se alcançar o objeto de desejo. E aí, fatalmente, as crianças e jovens (porque são saudáveis) vão procurar meios de burlar o que está sendo negado a eles.

Lidar com máquinas e aparelhos eletrônicos, para essa geração de crianças e jovens com os quais estamos lidando, faz todo o sentido. Não se trata de ser bom ou ruim. Está aí, e a nossa tarefa é transformar essa relação em algo produtivo, que gere novos conhecimentos. Qualquer coisa menos que isso, significa que estamos subutilizando as máquinas ou que temos medo delas...

Mas também não acredito no "pode tudo", porque essa atitude também não educa. É preciso conversar, reconversar, criar consciência, discutir os "não pode" e estabelecer acordos. Acordos de horários, acordos sobre os tipos de jogos que são mais ou menos adequados, acordos sobre a utilização de aparelhos eletrônicos nos espaços de estudo etc. E, cabe, aos adultos da relação, cumprir os acordos. Isso significa educar.

Algumas questões são fundamentais e, na minha experiência de mãe e educadora de jovens (trabalho com jovens na faixa dos 15 aos 21 anos), creio que a mais importante de todas é a coerência. Coerência entre o que pensamos, sentimos e agimos.

Não se educa com um discurso diferente da maneira como agimos.

Não dá pra ficar fazendo discurso de ter que ser respeitador, se o jovem não percebe o respeito nas relações que ele vivencia. Não dá pra dizer pro menino não ser preconceituoso, se ele observa a maneira pouco digna dos adultos (pais, professores) tratarem as pessoas que são diferentes deles.

Vamos sair do senso comum e abandonar os estereótipos que marcam os jovens como aqueles seres difíceis, inadaptáveis, que “não querem nada”...

Eles querem sim, querem ser tratados como pessoas que pensam, capazes de tomar decisões e querem também perceber que somos coerentes (nós, os adultos). O que eles não acreditam é na hipocrisia e odeiam ser enganados pelos outros.

Olho no olho. Sempre. Verdade. Franqueza. Virtudes. Fragilidades. Consistência.

Outra coisa que considero fundamental, além da coerência, é não nos esquecermos de como éramos quando adolescentes. Quais eram os nossos sonhos, em que pensávamos, o que fazíamos para “enganar” os nossos pais e professores, como gostaríamos de termos sido tratados. Essa medida – de como éramos – nos ajuda muito a entender quem eles são e como eles agem.

E, por último, da minha lista de “fundamentais”, é não ter medo de dar limites, não ter medo de dizer não. E, não é o não pelo não. É o não argumentado, denso, com propósito. É o não que convence.

Somos seres sociáveis e, como tais, estabelecemos compromissos de convivência para podermos avançar nos nossos propósitos comuns.

Nada do que falei é fácil de ser realizado no dia a dia, mas é possível e é bom que seja tentado.

Esse texto aparentemente sem nexo vem questionar, por fim, por que os professores do Estado do Rio de Janeiro precisam de uma lei para lhes dizer o que pode/deve ou o que não pode/não deve ser feito dentro do espaço escolar? Por que os professores precisam dessa tutela?

Quer dizer que vamos abrir mão de todas as possibilidades educadoras que os MPs, celulares, câmeras fotográficas etc nos trazem porque não sabemos dizer não? É isso mesmo, professores? Quer dizer que não sabemos mais educar? Precisamos de leis para nos dizer o que é adequado ou não nas nossas salas de aula?

Não é nosso dever, educadores que somos, ensinar os nossos alunos a utilizarem as tecnologias, sabendo tirar o melhor proveito delas, com espírito crítico e ético? Não somos nós que temos que estar na vanguarda do processo pra poder ajudar os nossos alunos a compreenderem melhor o mundo em que vivem?

Como vamos fazer isso nos escondendo do mundo?

Não se educa com proibição. Educa-se com consciência.

quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009

As profissões invisíveis

Há algum tempo saiu uma reportagem numa dessas revistas semanais, contando sobre a experiência de um psicólogo, estudante de mestrado na USP.

Durante um bom tempo, não lembro exatamente quanto, ele se vestia de gari e ficava varrendo o campus universitário. A experiência serviu de pesquisa para a sua dissertação, que pretendia discorrer sobre as “profissões invisíveis”*.

O estudante ficou entre assustado e deprimido, porque seus colegas e professores passavam por ele e sequer o cumprimentavam, não o reconheciam naquele uniforme, simplesmente porque não percebiam a sua presença.

O professor da Universidade Federal de Sergipe, Doutor Marcus Eugênio, em recente entrevista aos jornalistas Paloma Abdallah e Wellington Nogueira, diz que existem basicamente duas teorias para explicar as causas da invisibilidade social.

A primeira explica a invisibilidade a partir da percepção dos indivíduos. As pessoas estariam tão familiarizadas com o ambiente, que ele não produziria qualquer tipo de estímulo nelas. Assim, como um pedinte já faz parte da paisagem do centro das grandes cidades, muitas vezes passamos por eles e não nos damos conta. Segundo ainda o mesmo professor, a outra teoria utilizada pela Psicologia é a da banalização. Essa tem a ver com a despersonalização dos indivíduos. Muito utilizada no exercício de certas profissões, como por exemplo, os médicos, quando tratam seus pacientes pelo número do quarto em que estão internados ou pela doença de que o paciente é portador. Ou, ainda, quando os professores “conhecem” seus alunos pelo número da ficha de chamada.

Trouxe essa discussão para os meus alunos – turma de adultos que já trabalham na área das Telecomunicações – e que, pressionados pelas firmas, vêm buscar o curso técnico. E foi uma discussão muito rica, com tristes constatações, na medida em que eles se perceberam como parte desse grupo de profissionais “invisíveis” todo o tempo, porque trabalham nas ruas, pendurados nos postes, ou enfiados nos subterrâneos das cidades.

Muitas outras profissões e outras tantas ocupações trazem a marca da invisibilidade. E são, na maioria da vezes, praticadas por quem nos assegura limpeza urbana, socorro de saúde, segurança, informação e alimentação. São os lixeiros, enfermeiras, carteiros, guardas de trânsito, policiais, repórteres, feirantes e cozinheiros profissionais.

O que não nos causa orgulho algum é a confirmação de que a invisibilidade social atinge todas as profissões que na, escala social, são consideradas inferiores.

São pessoas que trabalham diariamente, têm responsabilidades e, no entanto, só o que se enxerga é o que está fora delas, é o que elas produzem, é o serviço que elas prestam. E, só percebemos a existência delas, se ficarmos insatisfeitos com a qualidade do serviço oferecido.

O ser humano tem que vir em primeiro lugar, sempre. Não dá mais para ficarmos errando tanto...


*Seu estudo deu origem ao livro “Homens invisíveis: relatos de uma humilhação social”. E seu nome é Fernando Braga da Costa.

Denise Vilardo