segunda-feira, 28 de abril de 2014

Já vai tarde!

Caríssimos, recebi esse texto de um grande amigo que me pede para publicar - uma vez que estamos vivendo tempos de puro revanchismo dentro da Secretaria Municipal de Educação do Rio (local em que é proibido pensar diferente), já há 7 longos anos. É com muito orgulho e carinho que publico, certa de que a “nossa razão de viver”, profissionalmente falando, continua presente na mente dos que ousam pensar e expressar suas ideias.

Grande e esperançoso abraço a todos

Denise Vilardo


Gostaria de tentar ultrapassar o slogan “Vaza Costin”, fazendo um balanço do que representou a gestão dessa senhora frente à Secretaria Municipal de Educação do Rio de Janeiro. Começamos em 2009, com a posse do Prefeito Eduardo Paes (50,83% dos votos válidos, contra 49,17% do rival, Gabeira). Legitimamente, escolheu seu secretariado. Para surpresa de todos nós, professores, a escolhida para a pasta da Educação foi a senhora Claudia Costin, paulista, ex-assessora do Ministro Bresser Pereira na gestão de FHC e, posteriormente, Secretária de Cultura de São Paulo, responsável por um processo de terceirização do serviço público federal, com argumento de que esse tipo de administração é mais barato.

Essa era a herança que nos cabia. Nosso primeiro espanto pode se resumir à pergunta: numa rede de ensino reconhecidamente organizada e competente, no que diz respeito à condução do ensino público no Brasil, não havia ninguém com perfil mais adequado para gerir a educação na cidade? Por que Claudia Costin?

A resposta veio rápida. Tomou posse em janeiro de 2009 e, em fevereiro do mesmo ano, já surpreendeu a todos, mesmos os seus colaboradores mais diretos, com um projeto de 'realfabetização', liderado pela Fundação Ayrton Senna. A justificativa era de que o sistema de Ciclos de Formação, recém implantado na Rede do Rio, havia produzido zilhões de analfabetos funcionais. Seu objetivo, confesso, era tirar do analfabetismo funcional essas crianças. Correção de fluxo, diziam muitos.

Cabe lembrar que, na primeira reunião entre os “técnicos” da Fundação e os “técnicos” da SME, os representantes da Ayrton Senna mostraram-se intrigados por estarem sendo convidados para implantar algo que, segundo os mesmos, “a equipe da SME está muito melhor preparada do que nós”.

Em seguida, implantou-se o malfadado e reconhecidamente ineficaz projeto do senhor João Batista, chamado Alfa e Beto, rejeitado pela própria SME anos antes, e expulso do sistema público de ensino do município de São Gonçalo. As milhares de cartilhas compradas foram recolhidas, por ordem do Ministério Público, que acolheu denúncia feita por professores da própria Rede Municipal, sobre a inadequação das mesmas para o Município do Rio de Janeiro.

Nesse mesmo embrulho, a Sangari Brasil/Abramundo foi contratada a preço bem significativo, para qualificar o ensino de Ciências na Rede.

Logo depois, foi a vez da Fundação Roberto Marinho ser contratada para implantar projetos de correção de fluxo e aceleração para os alunos do 2º segmento do Ensino Fundamental, analfabetos e/ou defasados idade/ano de escolaridade.

O primeiro enigma logo se esclarece: terceirizar é a ordem do dia! Ou seja, contratar, por preços exorbitantes, “atualizações pedagógicas” que poderiam ser feitas pelas equipes pedagógicas da própria SME, como sempre foi feito, fortalecendo, conferindo credibilidade e valorizando os educadores da própria Rede Pública.

Outro aspecto importante na política de educação da CC é o binômio Meritocracia/Índices: o IDEB/IDERIO/ALFABETIZA. Mais uma vez, institutos foram contratados a peso de ouro para aplicar instrumentos de medida (e não de avaliação) - era o objetivo per si.

Logo a reboque, chegaram as provas únicas, como meio de “controle” e “unificação” da aprendizagem, seguidas dos cadernos pedagógicos iguais, e mais ou menos (?????) obrigatórios, para todos os alunos e professores. Ou seja: de volta aos anos sessenta.

Reconhecemos que projetos de correção de fluxo são instrumentos importantes, mas devem ser usados por um período determinado. Está há seis anos na Rede, ou seja, continua-se a produzir defasagem. Hoje, esses projetos integram a estrutura regular do sistema de ensino da SME/RJ.

Temos 9 anos de escolaridade e seis projetos, totalizando 15 níveis na estrutura. Claro que as turmas regulares, depois de seis anos de “projetos de correção de fluxo”, encontram-se muito mais ajustadas quanto à relação idade/ano de escolaridade, mas à custa de quê?

Não houve produção de qualidade efetiva. É fácil afirmar isso! Os alunos que estão matriculados nos projetos não participam das provas que servem como instrumento de medida dos índices, portanto, os alunos com maiores dificuldades são invisíveis para os índices e, consequentemente, não fazem parte das estatísticas oficiais. Resultado óbvio: maior IDEB/IDERIO. Fórmula clássica e clara. Alguns adjetivam essa perspectiva de gerir “bons” índices como fraude.

Para coroar todo esse processo quase esquizofrênico, os vereadores aprovaram, num exemplo de subserviência vergonhosa ao alcaide, um plano de carreira para o professor DITADO pelo prefeito, com as bases mais sórdidas que a história da educação dessa cidade já viu.

O magistério carioca nunca foi tão aviltado! Transformam a carreira do professor num amontoado de horas, garantindo uma estrutura de operário do século XIX. Extinguem o professor II, de 22h e meia semanais, e o professor I de, 16h. Todos serão, no futuro, professores de 40h. Não se iludam! Isso é um retrocesso funcional na carreira do magistério, até porque os vencimentos não correspondem às exigências. A perspectiva neoliberal venceu.

Depois disso tudo, muito confortavelmente, a senhora CC vai para o Banco Mundial, dizer a quê e a quem serve, já que a missão por aqui foi cumprida.

Muito mais se poderia dizer. Sua assessoria era (continua lá!) composta, na sua maioria, por profissionais detentores de Cargos Comissionados e que jamais foram professores, além de serem de fora da Rede carioca. Destacamos o Rafael Parente, que desistiu de brincar de Educopédia, e a Heloisa Mesquita, arquiteta de formação, que coordena o Ginásio Experimental Carioca (perguntamos: experimenta o quê?).

Mas, por ora, já basta. Digo, sem medo de errar: já vai tarde.

Obs.: não tenho nenhuma esperança de que as diretrizes vão mudar na condução da “nova” gestão. Conhecer essa Rede e ter participado de sua história, inclusive em outras gestões, não garante nenhuma perspectiva de mudança, ao contrário. Os “próximos” serão, certamente, mais obedientes ainda. Talvez seja esse o aspecto que mais me incomoda. Trabalhei bem de perto com a maioria das pessoas que hoje participa do grupo responsável pela condução/gestão da política de educação dessa cidade. Garanto que o grupo pensava sobre a educação de forma MUITO, MUITO, diferente. Aliás, eram verdadeiros arautos e estudiosos do sistema de Ciclos e que hoje fingem rechaçar.

- See more at: http://www.redepeabirus.com.br/redes/form/post?topico_id=51601&pag=1#sthash.5BkF8lJI.dpuf