segunda-feira, 9 de julho de 2012

Sobre o Projeto de Lei 267/11*

Aceitei a proposta de reflexão sobre a alteração do ECA, no que diz respeito à punição legal/policial para os alunos violentos e desrespeitosos.

Vamos por partes...

Como não caminho sozinha, trago, em princípio o Bernardo Toro, quando diz que: "Não é possível pensar em sociedade sustentável com uma Educação para os nossos filhos e outra para os filhos dos outros."

Aos colegas que gostaram da intenção de termos policiais dentro das escolas para disciplinar os alunos com a lei, penso que só corroboram com a ideia porque ela trata dos filhos dos outros. É difícil aceitar uma situação dessas na escola em que nossos filhos estudam...

Em seguida, leio uma entrevista com Michael Barber (conselheiro na área de Educação e ex assessor de Tony Blair no MEC britânico) em que ele diz o seguinte: "As pessoas precisam escolher seguir a carreira de professor, e não virar um deles apenas porque não tinham nada melhor para fazer". E eu acrescento: além de acreditarem que fazer qualquer licenciatura, ao invés do bacharelado, ou mesmo o curso de Pedagogia, é mais fácil e rápido.

Infelizmente, a grande maioria dos profissionais do ensino com os quais lidamos diariamente, faz parte desse grupo. Infelizmente, vivemos uma situação legítima que é a necessidade de nos formarmos rapidamente, para poder entrar no mercado de trabalho (sic!) e começar a nossa vida profissional o mais cedo possível. É uma questão de sobrevivência. Sabemos que é difícil um professor ficar sem trabalho. Pagam pouco nos colégios particulares, não respeitam as obrigações trabalhistas, mas sempre há vagas... na rede pública, o descaso é o mesmo, mas sempre tem concurso pro magistério. E quando tudo isso falhar, podemos oferecer "aulas de reforço" pra vizinhança.

A esses dois pontos acrescento a questão - que já foi citada aqui na lista, nesta reflexão - por que é que precisamos de interferência externa para administrar o que é o nosso fazer interno, cotidiano? Por que é que é precisamos de leis para estabelecer o que é certo, errado, adequado, não adequado, aceitável, não aceitável na nossa rotina de trabalho? Por que é que precisamos transferir uma responsabilidade que é nossa para a tutela do Estado?


Algumas tentativas de resposta: porque acreditamos que a educação deve vir de casa... porque professor não é psicólogo... porque os alunos vêm para escola e não querem nada... porque os alunos não entendem que têm que ficar quietos na hora de ficar quietos, e só falar quando lhes for dada essa condição... porque nós não ganhamos para isso... pra ficar estressados e nem para lidar com marginais...

Será que já ouvimos essas "verdades" por aí? Pois, na contramão dessa realidade recheada de senso comum, peço a companhia do Frei Betto que diz que "Falta à escola abordar o sentido da existência." E afirmo que não é fácil, mas essa é a nossa tarefa, pessoal e intransferível. Esse é o nosso fazer profissional: ajudar a formar seres humanos. Seres humanos de verdade, daqueles que falam, riem, conversam, têm dor de cabeça, caganeira, choram, ficam com raiva, daqueles iguaizinhos a nós mesmos.

Temos que ser psicólogos sim, um pouco mães, um pouco pais, às vezes, pacientes, outras, impacientes. Somos educadores do/no Brasil, fazendo história e nos reconciliando com meninos e meninas que vivem castigados pela vida, por esse país afora.

Não somos repassadores de conteúdos cristalizados. Somos pessoas adultas numa relação de dar as mãos e caminhar juntos, de ensinar e aprender juntos. Não dá pra burocratizar a relação professor com aluno. Entrar na escola, cumprimentar ou não os colegas, ir para a sala de aula, já pensando na hora de ir embora para fazer coisas mais importantes...


Digo sempre para os meus professores e alunos que Escola não é lugar de violência de qualquer espécie: física, moral, psicológica; assim como não é lugar de medo. Quem quiser sentir essas emoções, que frequente delegacias, presídios e quartéis.

Da mesma maneira que Escola não é lugar de silêncio. Lugar de silêncio é hospital e locais de meditação.

Escola não é lugar de nãos absolutos, mas justificáveis; Escola não é lugar de regras desprovidas de sentido compartilhado por todos.

Escola é lugar de sins, de acolhimento, de imperfeições, de constantes ajustes, de acordos e combinados.

Mas, vou contar um segredo: tem que querer ser professor, educador, formador, mediador - o nome que queiram dar.

E mais: tem que querer olhar nos olhos e ser verdadeiro, sem medo de errar e sem nojo de meleca, catarro, cheiro de mijo ou de maconha. Tem que gostar de pessoas e de ficar perto delas, com elas.

Não abro mão de estar junto com meus alunos e professores, pois escolhi ser professora, que é diferente de ser missionária... É minha profissão, e requer, estudo e técnica, em constante aperfeiçoamento para praticar melhor. Requer salário e dignidade.

Requer que eu mesma me dê esse crédito.

Um grande e fraterno abraço


*A Câmara dos Deputados analisa o Projeto de Lei 267/11, da deputada Cida Borghetti (PP-PR), que estabelece punições para estudantes que desrespeitarem professores ou violarem regras éticas e de comportamento de instituições de ensino.

Em caso de descumprimento, o estudante infrator ficará sujeito a suspensão e, na hipótese de reincidência grave, encaminhamento à autoridade judiciária competente. A proposta muda o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.069/90) para incluir o respeito aos códigos de ética e de conduta como responsabilidade e dever da criança e do adolescente na condição de estudante.

Indisciplina De acordo com a autora, a indisciplina em sala de aula tornou-se algo rotineiro nas escolas brasileiras e o número de casos de violência contra professores aumenta assustadoramente. Ela diz que, além dos episódios de violência física contra os educadores, há casos de agressões verbais, que, em muitos casos, acabam sem punição. O projeto, que tramita em caráter conclusivo, será analisado pelas comissões de Seguridade Social e Família; de Educação e Cultura; e de Constituição e Justiça e de Cidadania.